segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Súmula Vinculante n.° 11 algemas

Teor da súmula: "Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e defundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado"..

Esta súmula, também chamada de súmula das algemas, foi elaborada em razão de um julgamento bastante importante do STF que anulou decisão tomada no Tribunal do Júri (HC 91.952 - Plenário – Rel. Min. Marco Aurélio - j. 07.08.08 – votação unânime). Isso porque, o réu foi apresentado aos jurados (cidadãos leigos) algemado.

De acordo com o Supremo Tribunal Federal, estar o réu algemado é tão impactante aos jurados que pode influir em sua decisão.

Para quem não sabe os jurados são pessoas do povo, geralmente sem formação em Direito, não estando acostumadas com o dia-a-dia forense.

Encarar o réu com cabelo raspado, roupa de presidiário e algemado é como enxergar ali o verdadeiro culpado. Isso porque, consciente ou inconscientemente, estas pessoas leigas acabam pensando o seguinte: “se o cidadão é réu, certamente tem alguma culpa”, “se está preso é porque o juiz acha que ele é culpado”, “se estáalgemado é porque é perigoso”.

Notem que o uso de algemas é uma agravante decisiva, capaz de influenciar sobremaneira o ânimo dos jurados.

Fora isso, o uso de algema causa sério abalo na pessoa do preso, ferindo sua dignidade.

Não são raras as vezes que vi pessoas chorando ao serem algemadas. Isso porque, sabe que sua imagem, bem muito precioso, certamente será maculada pela sociedade.

A pessoa fica exposta a opinião pública e passa a servir como objeto de prazer para algumas autoridades públicas. Estas, em muitos casos, acabam utilizando uma pessoa algemada e já flagelada para fazer imagem e grandes discursos na mídia, abrindo o inquérito policial como um jornaleco comprado em qualquer esquina e justificando seus atos para um público sedento por justiça e influenciado por opinião ignorante de alguns falsos jornalistas.

Felizmente são poucas as autoridades que agem desta forma.

De acordo com Rodrigo de Abreu Fudoli (in Uso de algemas: a súmula vinculante n.° 11, do DTF. Disponível em http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11625),

Fica claro que o que se evita é o sensacionalismo estimulado pelos órgãos de imprensa na cobertura jornalística da prisão de certas pessoas, que não são clientes habituais do sistema de justiça criminal. É importante ressaltar que o STF acertou ao coibir com veemência o sensacionalismo – e essa observação vale tanto para a criminalidade de "colarinho branco" quanto para a criminalidade "dos pobres" – eis que o direito de informar, titularizado pelos órgãos de comunicação social, não pode suplantar o direito à intimidade e à imagem do preso.

Esta súmula deve ser interpretada com certa parcimônia.

Em que pese a perfeição do raciocínio dos Ministros e de todo humanismo que serviu de base para a lavratura desta súmula, não deve ser dada interpretação literal.

A súmula deve ser interpretada de acordo com as decisões pretéritas que ensejaram sua composição, e não com numa leitura simples e desavisada de seus termos.

Primeiramente, deve-se frisar que formalmente trata-se de ato inconstitucional, eis que um dos requisitos para edição de súmula vinculante é a existência de decisões reiteradas sobre a matéria de natureza constitucional.

No caso desta súmula, como se pode notar, temos pouquíssimas decisões relevantes sobre a matéria envolvida. Assim, em que pese ser materialmente constitucional, tudo indica ser a súmula formalmente inconstitucional.

Deixando de lado este aparte e voltando ao ponto anterior, esta súmula não pode ser interpretada literalmente, mas sim de acordo com as decisões anteriores que formaram base sólida para seu nascimento.

Uma das decisões foi a do já citado HC. 91952. Aqui, o julgamento pelo Tribunal do Júri foi perfeitamente anulado, eis que o uso de algemas por parte de réu que não aparentava querer fugir, se ferir ou assim fazer quanto aos demais presentes, influi no ânimo e estado psicológico dos jurados. Como já foi dito, enxergar o réu com as vestimentas prisionais e usando algemas, gera certo desconforto psicológico maléfico ao mesmo.

Foi feito um estudo no exterior e ficou comprovado que os jurados (cidadãos leigos), se fossem optar em condenar um dentre dois cidadãos, optariam pelo mais feio. Imagine só um réu feio, com roupa de presidiário e algemado. Seria condenação na certa.

Somos seres humanos e, como tais, temos nossos pré-conceitos. Olhar um réu com roupa de presidiário, algemado, pobre e, ainda por cima, feio, certamente é meio caminho para a condenação.

Na psicologia isso é muito bem explicado. Quando éramos crianças, víamos na televisão filmes e desenhos de “bandido” e “herói”. O herói ou a heroína eram sempre os personagens mais bonitos, enquanto que os bandidos eram feios e mal vestidos. Esta imagem foi sendo sedimentada em nossas mentes e passou a servir como um “modelo” de crítica.

Por isso, um cidadão natural ou artificialmente (vestes, algemas etc.) caracterizado nestes moldes, inicia o processo penal com alguns pontos em desvantagem. Cabe à criatividade do advogado de defesa ou defensor público convencer estes seres humanos leigos do contrário.

Quanto ao juiz, as testemunhas e a vítima, o caso não é diferente. Numa audiência de instrução, debates e julgamento, por exemplo, o réu fica o tempo todo dentro da sala enquanto a vítima e as testemunhas prestam depoimento.

Certamente, a figura do réu colocado no canto da sala, com roupa de presidiário e algemado é circunstância que agrava, e muito, o convencimento da vítima e das testemunhas de acusação.

Explico.

Muitas vezes a vítima e as testemunhas presencias não viram direito o réu no momento do crime. Indo à delegacia de polícia, os policiais apresentam inúmeras fotos, sendo que na maioria das vezes a vítima acredita que determinada foto corresponde ao meliante. Este sujeito é processado e, na hora da audiência, o juiz pede para a vítima e testemunhas olharem para o réu e dizer se o reconhecem como autor do fato típico. Quando olham, vêem uma pessoa algemada, com vestes de presidiário, muitas vezes expondo marcas de maus tratos e, categoricamente, dizem: “é ele mesmo senhor juiz”.

Será que se o réu estivesse lá vestindo uma boa roupa, com cabelo bem penteado, sem algemas, a vítima diria ser ele o autor do crime?! Poderia até dizer que sim, mas certamente pensaria cinco ou seis vezes antes de afirmar com certeza.

Não são raros os casos em que a vítima, no momento do crime, viu o réu somente de relance. Sedenta por justiça, acaba reconhecendo fotograficamente na polícia um cidadão que parece ser o bandido. Na fase judicial, vendo aquele ser flagelado, algemado, com quatro ou cinco policiais armados ao lado, “não tem dúvida” em dizer que foi ele.

O Estado veste o cidadão de bandido e pergunta para a vítima e testemunhas se é ele o meliante.

Ora, é como colocar uma peruca e nariz de palhaço em qualquer pessoa e perguntar para uma criança se é ele o palhaço do circo! Lógico que ela vai dizer que sim!!!

Nessas horas lembramos do refrão da música cantada pelo gênio Renato Russo: “essa justiça desafinada é tão humana e tão errada. Nós assistimos televisão também, qual é a diferença?”.

A única pena desta súmula é ser bastante subjetiva. Os juízes certamente vão dizer (e já dizem) que o réu pode oferecer risco à segurança dos presentes.

Por isso, deve permanecer com as algemas, acessório este que irá ajudar a compor a fantasia de bandido.

Quanto à parte final da súmula que diz que a prisão vai ser revogada, confesso que não entendi direito, mesmo lendo os inúmeros textos que comentam este enunciado pela internet. Se há o requisito do fumus delicti epericulum libertatis, deve ser decretada e mantida a prisão cautelar. Não entendo como o uso de algemas na prisão pode afetar um desses dois requisitos.

É isso que tinha para tratar sobre o tema meus caros amigos. Qualquer dúvida, vamos procurar, juntos, esclarecê-la.


Fonte: GALVÃO, Bruno Haddad. Comentário à Súmula Vinculante n° 11 (algemas). Disponível em http://www.sosconcurseiros.com.br.

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