sexta-feira, 2 de janeiro de 2009

Decisão STF cria nova hierarquia Tratados Internacionais

29/01/2009 - Situação hierárquica dos tratados internacionais

Bom dia.

Escreverei, hoje, sobre a situação hierárquica dos tratados internacionais celebrados pela República Federativa do Brasil, no intuito de clarear alguns aspectos do meu último texto aqui no site.

Antes, porém, um breve bate-papo.

No início desta semana, foi anunciado pelo Ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, um corte provisório no Orçamento Geral da União/2009 da ordem de 37,2 bilhões de reais.

Com a notícia, muitos candidatos manifestaram preocupação com o risco de suspensão da realização dos concursos públicos previstos para o ano de 2009. Em verdade, recebi alguns e-mails de candidatos um pouco desesperados, em razão de duas realidades atuais: a crise financeira mundial + o corte provisório no orçamento.

Entretanto, numa entrevista coletiva, concedida no dia 27/01/2009, o Ministro Paulo Bernardo garantiu que os concursos previstos para 2009 serão mantidos, apesar da crise e do corte provisório no orçamento. Segundo ele, “não há nenhuma mudança de planos” e “a decisão de manter os concursos está tomada” (fonte: Agência Brasil, 27/01/2009).

Portanto, Senhores Candidatos, nada de desânimo! Eu duvido que essa crise venha prejudicar a realização dos importantes concursos previstos para 2009, tais como os da Receita Federal, da Polícia Federal, de Gestor Público etc.

Ademais, os cortes, ainda de natureza provisória, só atingem o Poder Executivo federal. Não há, portanto, nenhum reflexo em concursos dos Poderes Legislativo (do TCU, por exemplo) e Judiciário (dos tribunais), tampouco em certames dos demais entes federados (do fisco do Estado de São Paulo, por exemplo, previsto para este primeiro semestre/2009).

Bem, vamos ao assunto de hoje.

No dia 03/12/2008, o Supremo Tribunal Federal, em decisão histórica, firmou entendimento acerca de uma importantíssima questão, há anos debatida em nosso país: a posição hierárquica dos tratados internacionais sobre direitos humanos celebrados pela República Federativa do Brasil.

Em 08/12/2008, eu escrevi, aqui neste espaço, o Ponto nº 379, em que noticiei o novo entendimento de nossa Suprema Corte - os tratados internacionais sobre direitos humanos celebrados pelo Brasil têm status supralegal, podendo vir a ter status de emenda constitucional se forem incorporados pelo rito do § 3º do art. 5º da Constituição - e destaquei sua imediata conseqüência em nosso ordenamento pátrio: o afastamento da possibilidade da prisão civil por dívida do depositário infiel.

A partir da publicação desse meu texto, percebi, pelos e-mails por mim recebidos, que alguns visitantes estão fazendo confusão com o assunto “situação hierárquica dos diferentes tratados internacionais celebrados pelo Brasil”. Vamos, então, nos parágrafos seguintes, afastar tal confusão.

Em verdade, a partir de 03/12/2008 (data do novo entendimento do STF), os tratados internacionais celebrados pelo Brasil poderão ter, no ordenamento jurídico brasileiro, três posições hierárquicas distintas, a depender do seu conteúdo (assunto tratado pela norma internacional) e das formalidades para o seu ingresso no nosso ordenamento jurídico (procedimento de incorporação).

Com efeito, a partir do novo entendimento firmado pelo Supremo Tribunal Federal, os tratados internacionais celebrados pelo Brasil poderão assumir, no nosso ordenamento jurídico, as seguintes posições hierárquicas:

a) hierarquia supralegal;

b) hierarquia constitucional;

c) hierarquia ordinária (legal).

Vamos examinar, separadamente, essas três espécies de tratados internacionais.

1) Tratados internacionais com hierarquia supralegal

Segundo a recente jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, os tratados internacionais sobre direitos humanos celebrados pela República Federativa do Brasil e incorporados ao nosso ordenamento pelo rito ordinário (aprovação definitiva por decreto legislativo do Congresso Nacional e promulgação por decreto do Presidente da República) têm hierarquia supralegal, isto é, estão situados hierarquicamente acima das leis, mas abaixo da Constituição Federal.

Com isso, esses tratados internacionais afastam a eficácia da legislação infraconstitucional com eles conflitante, bem assim impedem que legislação futura dessa mesma natureza que lhes contrarie seja válida. Têm, enfim, prevalência sobre o direito infraconstitucional com eles conflitante, seja ele pretérito ou futuro.

Anote-se que, ao firmar esse novo entendimento, o Supremo Tribunal Federal terminou por inovar o conceito da pirâmide jurídica desenvolvido por Hans Kelsen, criando, em nosso País, um nível hierárquico intermediário entre as leis e a Constituição Federal – o nível intermediário da chamada “supralegalidade”, em que se situam os tratados internacionais sobre direitos humanos incorporados ao nosso ordenamento pelo rito ordinário.

Dentre esses tratados internacionais, destacam-se o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – Pacto de San José da Costa Rica, ambos promulgados pelo Brasil no ano de 1992.

2) Tratados internacionais com hierarquia de emenda à Constituição

Os tratados internacionais sobre direitos humanos celebrados pela República Federativa do Brasil e incorporados ao nosso ordenamento pelo rito previsto no § 3º do art. 5º da Constituição Federal são equiparados hierarquicamente às emendas à Constituição Federal.

É o que determina a Constituição Federal, nos termos seguintes:

“os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais” (art. 5º, § 3º, introduzido pela EC nº 45/2004).

É o caso do Decreto Legislativo nº 186, de 2008, que aprovou, nos termos do § 3º do art. 5º da Constituição Federal, o texto da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e de seu Protocolo Facultativo, assinados em Nova Iorque, em 30 de março de 2007. Essa Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência constitui a primeira norma internacional sobre direitos humanos celebrada pelo Brasil e incorporada ao nosso ordenamento jurídico com status de emenda constitucional, na forma do § 3º do art. 5º da Constituição Federal.

3) Tratados internacionais com hierarquia ordinária (legal)

Os tratados internacionais em geral, que não versam sobre direitos humanos, são incorporados ao nosso ordenamento pelo rito ordinário (aprovação definitiva por decreto legislativo do Congresso Nacional e promulgação por decreto do Presidente da República) e têm hierarquia ordinária (legal), isto é, estão numa situação de paridade hierárquica com as leis em geral.

Esses tratados internacionais, portanto, não dispõem de supralegalidade (não estão acima das leis), tampouco de status constitucional (não se equiparam às emendas constitucionais). São, simplesmente, equiparados hierarquicamente às leis.

Cabe ressaltar, ainda, que, especificamente em matéria tributária, os tratados internacionais têm tratamento legal expresso no art. 98 do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172/1966), dispositivo em pleno vigor. Segundo esse dispositivo legal, “os tratados e as convenções internacionais revogam ou modificam a legislação tributária interna, e serão observados pela que lhes sobrevenha”.

Por fim, um aspecto importante, já cobrado em diversos concursos recentes: os tratados internacionais celebrados pela República Federativa do Brasil, independentemente do procedimento de sua incorporação e da sua posição hierárquica, submetem-se a controle de constitucionalidade pelo Poder Judiciário brasileiro, seja na via incidental (modelo difuso), seja na via abstrata (modelo concentrado).

Um forte abraço – e bons estudos!

Vicente Paulo


fonte:
http://www.pontodosconcursos.com.br/...t=3990&idpag=1